Quando pensamos nos céus da Europa durante a Segunda Guerra Mundial, muitas vezes nos lembramos dos bravos pilotos brasileiros que lutaram ao lado dos Aliados na Itália. Mas a história muitas vezes guarda camadas inesperadas. E se eu dissesse que os brasileiros também usavam o uniforme da Luftwaffe, a força aérea da Alemanha nazista? Este é um capítulo quase esquecido da história: a história de dois brasileiros que lutaram… do outro lado da guerra. Esta é a história de Egon Albrecht-Lemke e Wolfgang Ortmann — dois nomes que nos desafiam a olhar para o passado com mais profundidade, menos dualismo moral e um senso mais crítico do que significa "pertencer".
Egon Albrecht-Lemke, nascido em Curitiba e de ascendência alemã, foi um exemplo da mobilização mundial promovida pela Alemanha, convocando os cidadãos do Reich a atenderem ao chamado de Hitler. Muitos homens e mulheres alemães, ou seus descendentes, foram para a Alemanha e se juntaram aos esforços para servir à "pátria". Como o Partido Nazista no Brasil era o maior fora da Alemanha, não foi surpresa que Albrecht tenha viajado para lá na década de 1930 para se juntar à Juventude Hitlerista. Mais tarde, tornou-se piloto de caça e participou das operações da Luftwaffe na Europa no início da década de 1940, quando tinha apenas vinte e poucos anos.
Albrecht participou de grandes invasões nazistas na Holanda, França e na Batalha da Grã-Bretanha. Posteriormente, foi transferido para a frente russa, onde abateu 15 aviões. Recebeu diversas condecorações e foi promovido a capitão e líder de esquadrão. Retornou à França no final de 1943 e, no início de 1944, foi enviado para defender a Áustria, que havia se tornado alvo dos esquadrões de bombardeio aliados que partiam da Itália.
Graças à sua habilidade, Albrecht-Lemke foi condecorado com a prestigiosa Cruz de Cavaleiro da Cruz de Ferro. Com o alto número de baixas em combate e a crescente dificuldade em substituir pilotos da Luftwaffe, muitos foram forçados a voar em inúmeras missões, durante as quais abateram diversos aviões aliados, o que lhes rendeu diversas medalhas. Albrecht-Lemke juntou-se ao grupo de elite de aviadores que recebeu esta alta condecoração alemã após abater 25 aeronaves inimigas.
Usado como símbolo da propaganda nazista, Albrecht-Lemke apareceu em fotografias ao lado de grandes ases alemães como Adolf Galland e Walter Krupinski. Devido à alta taxa de mortalidade que assolava os pilotos alemães, ele também morreu em combate em 25 de agosto de 1944 — o mesmo dia em que Paris foi libertada. Em sua missão final, a leste de Paris, seu avião sofreu uma avaria. Ao tentar retornar à base, foi atacado por aeronaves aliadas. Ele saltou de paraquedas, mas não sobreviveu. Mais detalhes sobre sua vida permanecem obscuros. Talvez o bravo aviador nem sequer fosse considerado brasileiro por seus companheiros, pois havia escolhido deixar o Brasil e lutar pelo Terceiro Reich — ou talvez ele não se considerasse mais brasileiro.
Wolfgang Ortmann, nascido em São Bento do Sul, Santa Catarina, foi outro brasileiro que acabou voando para a Luftwaffe. Ele pilotou a mesma aeronave — o bimotor Messerschmitt BF 110 — na mesma unidade e na mesma época que Egon Albrecht-Lemke na frente russa. Não há evidências de que eles tenham se conhecido. Registros de guerra o descrevem como um piloto habilidoso, mas em fevereiro de 1942, Wolfgang morreu em uma colisão aérea com outro BF 110 de seu esquadrão, de acordo com relatórios do esquadrão. No entanto, também há registros de um piloto russo que alegou ter abatido os dois aviões alemães na mesma data.
As histórias de Egon Albrecht-Lemke e Wolfgang Ortmann nos confrontam com as contradições da época em que viveram. Filhos do Brasil, moldados por raízes alemãs, eles escolheram — ou foram compelidos — a servir um dos regimes mais sombrios da história moderna. Seus feitos aéreos foram notáveis, mas a causa pela qual lutaram nos leva a uma reflexão séria. Não se trata de glorificação, mas de compreensão histórica. Recordar seus caminhos é também lembrar que, mesmo nos momentos mais sombrios da humanidade, identidades nacionais, culturais e ideológicas se entrelaçam — e o que parece simples... muitas vezes não é.
Referência: BARONE, João. 1942: O Brasil e sua guerra quase desconhecida. Brasil: HarperCollins, 2018.

Matheus Araújo
Matheus Araújo é idealizador e editor da Brazilian History. Natural do Rio de Janeiro e formado em Publicidade e Propaganda, a sua paixão por história fez com que ingressasse na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e atualmente está cursando Licenciatura em História.